Clash of The Titans (2010) é assumidamente um blockbuster que tinha tudo para dar certo!
Remake de uma obra feita em 1981, era com muito agrado que via esta iniciativa. Pegarem num filme de culto e acrescentarem para seu proveito os recursos mais state of the art disponíveis no mercado. Pensava que iria surtir efeito, porque o material fonte era aprimorado. Lembro-me sempre de muito novo ver o original, completamente fascinado pelo incremento do fantástico que poucas vezes vira fora do mundo dos desenhos animados. Aliado a isso, as primeiras convenções mitológicas que adquiri com algum interesse foi através do filme e eventualmente mais tarde com a leitura e estudo das aventuras de Ulisses, obra popular escrita por Homero, de quem grande maioria já terá certamente ouvido falar. Tanto no mundo literário como na grande/pequena tela, este tipo de fábulas/contos/lendas/aventuras eram colossos de peso, sendo o Clash of The Titans uma das maiores referências cinematográficas da minha infância, associadas ao imaginário.
Depois de anunciado o remake e, principalmente, com a chegada do primeiro trailer, tornara-se transparente que a longa-metragem iria levar um outro tratamento, ou melhor, uma outra abordagem. O fio-de-conduta praticado estava fortemente ligado às cenas de acção, assustando-me ao ponto de pensar que o contemporâneo seria antagónico à primeira versão "arcaica", no entanto, confiei cegamente em Louis Leterrier para que não preterisse do enredo, dos diálogos e até da representação para dar aso à compulsivamente desnecessária intervenção de momentos de confronto/batalha (para não voltar a usar o termo acção). Pois bem... talvez devesse primeiro analisar o percurso do realizador antes de criar as minhas expectativas. Recordando-me apenas do seu último projecto, o reboot de Hulk (2003), agora com o título de The Incredible Hulk (2008) com o Edward Norton, fui ingénuo ao ponto de lhe conceder algum crédito, devido à sua recuperação de um filme fraquissímo na altura dirigido por Ang Lee, contudo, remetido no meu computador, recorri ao IMDb como auxiliar de memória para que me fosse evocado o portefólio do homem a quem foi encarregue reaproveitar um clássico. Sem surpresa, fui confrontado com poucas obras, todas ela do mesmo cariz... vocês percebem pelos nomes:
The Transporter (2002), Danny The Dog (2005), The Transporter 2 (2005) e o já referido, The Incredible Hulk, que não sendo filmes maus, a verdade é que não devem muito a elementos que não as coreografias encenadas pelos protagonistas e os seus duplos (quando necessários, claro! - não quero de todo menosprezar Jason Statham ou Jet Li)
Independentemente do que me esperava, procurei não focar no que poderia correr mal, mas sim naquilo que poderia correr bem. Postura recheada de optimismo era o que tentava impor forçosamente, pois a ideia de que os meus "Titãs" pudessem vir a ser um fracasso era demasiado para eu ter que lidar.
A dada altura terão todos passado pela experiência de ter elevado apreço por um determinado projecto e vê-lo ser totalmente corrompido nas mãos de outra pessoa. É penoso, nem que pela a sua desnecessária tomada de curso. Há coisas que mais vale não tocar... não interferir...
Enfim... ontem, na véspera de ver o filme, ainda fui avisado para não despender do meu tempo a ir ao cinema, e confesso, que estive perto de seguir tal conselho, mas a evocação nostálgica e a sua simbologia falaram mais alto. No final, depois de assegurada a certeza que realmente o filme era mau (onde até sou da opinião que a pontuação estipulada na internet o favorece em demasia), fiquei desolado com o que acabara de ver, porém, satisfeito de ter levado avante a ida ao cinema. Digo isto porque prefiro antes ter dissipado qualquer réstia de dúvidas que pudesse haver, em prol da manutenção de incerteza. Além do mais, de certa maneira fico feliz por ver a arte cinematográfica em muitos aspectos desactualizada, prevalecer sobre a indústria que domina o circuito dos tempos de hoje.
Metaforicamente falando (tendo como influência o conteúdo do filme em causa), se o Clash of The Titans de 1981 é um Deus (preferencialmente Zeus neste caso), então este remake não passa de um mero mortal... sem vida, sem chama, sem surpresa! Rompido do seu núcleo duro, a história, foram feitos vários acertos desacertos ao argumento original, tendo sido escandalosamente manipulado e maltratado com o intuito de fabricar um rebuscado artificio, engendrado para fabricar dinheiro, apelando ao visual que pouca riqueza estética oferece à audiência para contemplar. O conceito 3D, mais uma vez, é pouco interventivo no ambiente instalado na sala de cinema, sendo mais um pretexto para fazerem lucro "à nossa pala". Com um elenco até sonante, fica patente o quão envolvidos estariam os actores, nomeadamente Liam Neeson e Ralph Fiennes ($$$$$$$$ -> óbvio, certo?). Sam Worthington já não choca... Pudera! Depois de consecutivos blockbusters (Terminator Salvation e Avatar) esta estrela em ascensão apenas aproveita a maré para se estabelecer como um player nos filmes mais lucrativos que conseguir agarrar.
Concluindo, posso afirmar neste caso, quecomparar o passado e o presente, é confirmar a ausência do bom senso e o pouco respeito existente por aquilo que por mérito próprio ganhou o estatuto de intemporal.
Ahhh... e uma curiosidade...
Ontem o filme pareceu relativamente curto! Tal facto parecia assentar bem, visto que tendo esta nova versão retirado muito do desenvolvimento ocorrido no seu antecessor, seria natural que fosse exponencialmente menor em termos de duração. Mas não! Ambos os filmes têm exactamente 118 minutos!! O que me surpreende (e de que maneira!) porque revela o tipo de proveito efectuado. Não faz qualquer tipo sentido. Mas fica a proeza! Desaproveitar e destruir com o mesmo tempo e com mais recursos! Evidente que não é a primeira nem última vez que tal venha a acontecer... mas por agora, deixem a minha azia falar ...
1 comment:
o retrato certo disso que falas (um pouco diferente mas a analogia é fácilmente entendível) é um episódio da série Southpark que se chama "the China problem", série 12, episódio 8.
Vale a pena ver porque retrata bem o que dizes nesse post.
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